Giovanni Gentile

domingo, 20 de fevereiro de 2011

A filosofia do fascismo - Giovanni Gentile (parte 3)



7. Palavras bonitas? Mas tais palavras estão no coração de homens que, na dedicação absoluta ao ideal, foram soldados e mártires da sua fé, de homens que ofereceram e oferecem a própria existência. Quantos? A realidade e, portanto, o valor de uma ideia histórica, não se mede pelo número de adeptos que a serviram, mas pela sinceridade, pelo génio, pela energia espiritual luminosa e criadora dos poucos que acreditaram nela e daquele que ergueu o pendão dessa fé e teve a virtude de arrastar multidões. A história não é feita por heróis nem por massas, mas pelos heróis que acolheram no coração o frémito secreto e o ímpeto potente das massas, e pelas massas que só fazem história quando encontram num homem a consciência da sua alma obscura.
Na verdade, o mundo moral é o das multidões, mas das multidões governadas e postas em movimento por uma ideia de traços precisos que se revela apenas a poucos, à elite que dá forma e vida à história. Multi vocati, pauci vero electi.
Por outro lado, o fascista sente e afirma que a realidade humana não é imobilidade, não é uma forma que tomou acto de uma vez para sempre. A sua política é a política da vida, do movimento, do devir; de um estado que é sempre e não é nunca, num equilíbrio instável que é desenvolvimento; é uma luta de elementos contrastantes que prevalecem alternadamente e que só no infinito realizam o ideal, a lei e o motivo da luta. Os palradores de Genebra (se é que ainda há alguns depois de tantas lições de realismo político) e das cidades idilicamente enamoradas e adoradoras dos falsos ídolos da paz e da fraternidade, opõem-se e condenam com gritos de escândalo e cinismo a sinceridade do italiano de novo estilo; o fascista sente e afirma que a vida não é imobilismo, mas movimento, que não está na paz - tão cara aos que estão bem e que, por isso, se mantêm imóveis - mas na guerra sagrada, em todos os tempos, nos que não se abandonam negligentemente ao instinto, que encontram no coração a justiça que é preciso ainda pôr em acto e que vêem as lágrimas que há que enxugar no homem; em suma, concebe a sua existência como milícia ao serviço de um ideal - não, decerto, da subjugação egoísta dos outros - de um mundo em que todas as aspirações legítimas sejam satisfeitas. Ideal do indivíduo singular, ideal das nações, ideal humano. Ideal do homem que nunca verá esgotada a sua tarefa e que olhará ansiosamente o mundo de amanhã, não como um sonho, mas, muito seriamente, como uma realidade.
Fadiga diária, fadiga incessante de alma em vigília, a toda a hora, fixado no fim a atingir, sempre atingido mas nunca atingido.

8. Nesta viril concepção da vida está o princípio da teoria fascista que define o Estado como organismo ético: isto é, como consciência e vontade em acto, na qual desemboca e actua plenamente a consciência e a vontade do indivíduo na sua essência moral e religiosa. O que se persigna ao ouvir falar do carácter ético e, por isso, totalitário, do Estado fascista, que na sua actividade consciente resolve por completo toda a forma de actividade humana, económica ou religiosa, separa o Estado do valor moral, ao qual, no entanto, este ascende e se adapta, e considera-o coisa meramente temporal, ou melhor dizendo, material; esse é culpado de condenar à amoralidade absoluta o Estado, ou seja, todo o cidadão portador de vontade estadual, como condena os animais e todas as coisas que, por não terem em si o princípio da moralidade, não poderão recebê-lo do exterior.
O Estado fascista é um Estado ético, uma vez que a estrita, completa e concreta vontade humana não pode não ser ética. É também um Estado religioso. Não significa isto que seja um Estado confessional, mesmo que ligado com tratados e concordatas a determinada Igreja, como está ligado o Estado italiano. A limitação que tais tratados e concordatas trazem à liberdade do Estado (que no Estado moderno, isto é, segundo a consciência moderna, não pode deixar de ser liberdade absoluta) é uma autolimitação semelhante à que o espírito humano pratica para se fixar numa forma concreta; semelhante àquela que faz com que o italiano não abdique da sua liberdade quando, para falar, é obrigado a falar uma língua determinada à qual deve sujeitar-se por possuir uma gramática. Na realidade histórica da nação, o Fascismo sentiu que ser religioso equivale a ser católico. Para adequar o Estado à personalidade do italiano, foi ao encontro da Igreja Católica, pôs fim ao velho dissídio e pacificou nos ânimos pátria e religião sem nunca ter deixado de manter intacta e intangível a sua autonomia frente à Igreja. Por essa razão, reivindicou o direito à educação das novas gerações que a Igreja, curadora de almas, reservava para si como matéria da sua exclusiva competência.

9. O carácter totalitário e ético do Estado fascista permaneceria uma exigência ou uma afirmação teórica se esse Estado não resolvesse em si ou, como hoje se prefere dizer na Itália, não enquadrasse a massa do povo nos seus objectivos, categorias e especificações económicas e nas suas directrizes e orientações espirituais e morais. A reforma constitucional que o regime fascista pôs em estudo em 24 e que em 27 foi proposta nos seus postulados fundamentais na Carta deZ Lavara, desenvolveu-se sem improvisações apressadas com as leis de 20 de Março de 1930 e de 5 de Fevereiro de 1934 sobre o Conselho Nacional das Corporações e sobre a constituição e funções destas, bem como com a criação da Câmara dos Fascios e das Corporações. Dessa transformação do Estado bastará indicar o conceito central que a inspira na totalidade.
O conceito de unidade de nação orgânica, não amorfa e abstracta mas determinada, específica e concreta, é o Estado; neste, reside a vontade universal, não como uma forma vazia que se impõe ao conteúdo, mas como a própria forma conaturada com esse conteúdo, ou seja, do indivíduo na plenitude das determinações da sua personalidade. Personalidade produtiva, mas não justaposta indiferenciadamente às múltiplas unidades produtivas coexistentes e reunidas naquilo a que Regel chamava o atomismo da sociedade civil ou económica (como se quiser). Nas suas especificações e mútuas relações, o Fascismo concebe a produção num sistema orgânico onde o indivíduo vê a própria obra conexa com a de todos os outros; não mais simples actividade económica, mas actividade moral e política simultâneas porque determinada segundo um sistema de relações derivadas do interesse supra-individual da nação à qual todos os interesses do homem económico se subordinam e na qual todos os antagonismos de indivíduos e classes são harmonizados e resolvidos. A economia toma-se política, não apenas em palavras, mas abertamente, põe-se em acção o princípio da intervenção do Estado (que, de resto, actuou sempre, mau grado certos dogmatismos teóricos) na regulamentação das relações económicas. Fazer coincidir a organização política com a especificação económica da nação, inserir o indivíduo real e vivo no sistema do Estado e dar-lhe a possibilidade de desenvolver activamente a sua livre actividade como brota das suas necessidades, do seu interesse e, ao mesmo tempo, da sua consciência política (fascisticamente política), é o mais poderoso e significativo esforço da Revolução Fascista no sentido de tomar a liberdade, que no passado era um ideal de vida longínquo, uma realidade concreta e efectiva.

Fonte: Giovanni Gentile, A Filosofia do Fascismo, (La Filosofia dei Fascismo) In Para a Compreensão do Fascismo, org. António José de Brito, 1999, Nova Arrancada. Transcrito de http://forumpatria.com/debate-politico-e-ideologico/a-filosofia-do-fascismo-giovanni-gentile/.

Nenhum comentário:

Postar um comentário